Há algum tempo
tenho selecionado o domingo como “o dia para ninguém”. Explico: somente a minha
família receberia a minha atenção durante aquelas horas tipicamente
preguiçosas. Como não moro mais com os meus pais, separo esse dia para sairmos
juntos, visitarmos as praias, restaurantes, feiras, espaços culturais ... nada
cansativo, ou que exija muito esforço.
Muito embora esse seja o nosso dia de encontro
e passeios, decidi ficar em casa deitado na rede e lendo. A falta de disposição
para fazer qualquer outra coisa realizada nos outros dias da semana, como
sempre, foi a mesma típica de todos os outros domingos. Para mim, o nome do
primeiro dia da semana deveria ser “dominguiça”!
Não sei por qual motivo, mas algum vizinho
descobriu que eu estava em casa, a despeito de minha porta e grade principais permanecerem
fechadas, televisão desligada. Apenas eu, a rede e um livro de crônicas de Martha
Medeiros. No intervalo entre as páginas humoradas, o interfone toca
insistentemente. Não seriam os meus pais, muito menos amigos com quem me
socializo durante a semana. Tampouco seria a minha orientadora da
pós-graduação, pois nem mesmo sonha onda moro (graças a Deus!). Restaram-me as
opções dos presentes vizinhos.
Parei e pensei se deveria atender às
insistentes chamadas. Decidi não me levantar da rede e parar a leitura. Não por
indisposição, mas porque refleti sobre o fato de sempre fazermos tudo com tanta
seriedade, sobriedade, perfeição, e estarmos sempre preparados para atender a
qualquer chamada (mesmo as que são cobrar!).
Atendemos com tanta ligeireza e presteza aos
pedidos de “socorro” de nossas famílias, às súplicas dos amigos, aos prazos de
entrega de nossas produções intelectuais, ou de trabalhos, às datas de
pagamentos de contas fixas e cartões de crédito. Emprestamos os nossos ouvidos
com tanta empatia, selecionamos expressões cabíveis ao coração de quem precisa
de direção.
Decidi! Simplesmente decidi fazer o que diz o
texto de Clarice Lispector: “Mude! Mas comece devagar, porque a direção é mais
importante que a velocidade”.
Não movi meu corpo em direção ao cômodo onde
fica o interfone. Deixei que exercesse o papel para o qual foi designado:
chamar atenção! E, após mais algumas páginas viradas do livro, analisei que
assim devem ser as nossas atitudes para sairmos da rotina da empatia, presteza,
ligeireza, disposição, produção e empréstimo dos nossos ouvidos. Apenas
respeitar o direito de ficar um pouco na rede com a nossa autocompanhia. E a de
um livro.
Ah! O interfone cansou de fazer o anúncio de
que alguém me procurava e até hoje não me avisou quem era.
Imagem do cartunista Benett
Texto muito bom! Parabéns professor.
ResponderExcluirMeu amigo, considero esse momento um luxo, algo que para mim parece um sonho distante... Ah... a solidão faz tão bem ao nosso bem!
ResponderExcluirKkkkk...Bem eu,as vezes!
ResponderExcluirMesmo convivendo com Mãe e Avò,tenho ousadia de fechar a porta do meu quarto e mesmo com berros e batidas,me anulo para qualquer outra reação q n seja...ficar simplesmente deitada!
Kkkkk...Bem eu,as vezes!
ResponderExcluirMesmo convivendo com Mãe e Avò,tenho ousadia de fechar a porta do meu quarto e mesmo com berros e batidas,me anulo para qualquer outra reação q n seja...ficar simplesmente deitada!
Adorei o texto professor!
ResponderExcluirAdorei o texto professor!
ResponderExcluirBem minha cara esse texto!! Muito bom parabéns.
ResponderExcluirMuito bom! Mas a orientadora acessa o google maps rsrsrs!!
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