Todo vaidoso, com as
penas arrumadas na cabeça, com um bico cantador, usando calças de linho
boca-de-sino, camisas de botão, ou bermudas curtas mostrando as pernas
torneadas e um bundão invejável. Quem disse que passarinho não poderia ser
assim?
Conheceu uma andorinha
em um escritório. Cada um deles tinha um noivado. Decidiram se envolver,
engravidar de um passarinho menino e largaram suas bodas sem receio.
Voaram!
Mas eram tantos voos,
que nem a chuva ou o Sol os impediam. Se uniram, alugaram um ninho de barro,
trabalharam duro vendendo calcinhas, cuecas e panelinhas em uma esteira na
calçada de quem não enxotasse aquelas pequenas aves. Passarinhos também são
criativos!
Mudaram de cidade, de
estação, levaram caixas com preciosidades da sua história e do seu ninho
consigo.
Nasceu o segundo
passarinho menino. Cabeça grande, penas lisas, olhos arregalados e uma
energia quase hiperativa. Era agora um ninho completo!
Ainda não! Faltava mais
alguém! O primeiro passarinho menino decidiu voar cedo e modelar o nosso ninho,
de onde nasceu outra andorinha, prematura, para alegrar os movimentos femininos
na família das aves.
O passarinho da Kombi
vermelha reunia todos os seus filhotes e a sua andorinha e os levava para
passear. Que mundo grande! Foram muitas viagens com aquele bando. Aquele dono
da Kombi vermelha nos ensinava a fazer amizades, a dar gargalhadas, a cantar,
fazer contas, ler livros, a cozinhar, a cultivar plantas e a cuidar do ninho.
Como qualquer vida,
nada poderia ser tão fácil para aqueles passarinhos. Os invernos chegaram
fortes, rudes e pesados. Parecia que o Sol iria demorar a chegar. Mas o
passarinho, dono da Kombi vermelha, com a qual resolvia tantas coisas do seu
ninho, sempre tinha bom humor, assobiava, cantarolava, contava histórias e se
balançava em sua cadeirinha de balanço, como quem quisesse trazer leveza ao seu
ninho debaixo de fortes invernos. Contava histórias dos seus outros ninhos:
eram tantos primos, tios, tias, avô e avó, sobrinhos e sobrinhas que quase não
cabiam em um assobio só.
Um dia, o passarinho
vaidoso, com belas pernas, penas sempre arrumadas, calças e bermudas bonitas,
precisou se desfazer da Kombi vermelha. Precisou se encontrar com a sua saúde
debilitada e com suas penas caindo dia a dia. Suas calças e bermudas bonitas
não o interessavam mais. Ele agora não voava, pois precisava se apoiar em
bengalas e muletas. Dizia, sempre, que voava ouvindo as histórias dos voos dos
seus meninos.
Ele só queria as
andorinhas e os passarinhos meninos por perto.
Ficou velhinho,
indefeso, frágil, recolhido em seu ninho sem querer muitos festejos, muitos
movimentos. Queria o aconchego para superar os invernos e as chuvas.
Em uma Semana Santa, de
2019, o passarinho decidiu descansar dos invernos e das turbulências. Chamou a
sua andorinha, deitaram no ninho, seguraram as mãos, se lembraram das tantas estações,
dos ninhos que tiveram, dos voos que fizeram, dos meninos, da andorinha nova,
dos choros, dos sorrisos, dos assobios, das cantaroladas, das vaidades.
Disse para a sua
andorinha que queria partir em um voo para o desconhecido. Não sabia para onde
seria, nem o que o esperava, mas estava disposto. Escolheu seguir apertando a mãozinha
da andorinha sensível, que chorou ao se despedir. Era o último aperto de suas
mãos!
Os passarinhos meninos
foram chamados. A andorinha nova também. Choraram ao entender que era o momento
de saber sobre outros voos. Ninguém queria ficar longe daquele dono do humor,
dos sorrisos, dos assobios e do ninho. Mas aceitaram, pois entenderam que
aquele novo voo iria transformar o passarinho da Kombi vermelha em uma estrela
reluzente no céu.
Hoje, é dia de chuva,
Semana Santa, dia de silêncio, mas dia de um brilho tão especial, que nem as
andorinhas saberiam explicar.
Pai, sempre serás o
nosso carequinha sorridente. Dono da Kombi vermelha. Voe e brilhe muito, para
nos contar como são os outros ninhos e o céu de estrelas reluzentes.